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Specularis — Looking Through

Specularis, a realizar no Museu Alberto Sampaio em Guimarães, é uma exposição aberta para integrar os diversos estudos e trabalhos realizados em torno da gravura e o do vidro. Tem por objectivo dar visibilidade sobre uma colaboração entre diferentes pessoas e suas áreas de interesse tecnológico, sediadas na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto.

  • Edição
  • Teresa Almeida
  • Ano
  • 2018
  • isbn | issn
  • 978-989-54111-4-6
Specularis

Nos últimos anos, o ambiente criativo e de colaboração entre gravura e vidro foi capaz de criar e suportar linhas de investigação e estudos contendo vários tipos de problemas. Como podem estes campos estabelecer diálogos entre si e comunicar conteúdos relacionados com a criação artística? Como compreender e transformar as matérias primas quando estas são pensadas a partir de duas perspectivas tecnológicas? Como fazer dialogar os métodos, combinar processos, materiais e dinâmicas, posicionando- as no cruzamento e no contexto de um processo criativo contemporâneo que tenta uma aproximação ao mundo?

Ao longo dos anos, e a partir das duas oficinas, juntaram-se esforços para superar a resistência em inovar em contexto académico. E a procura do que está por saber e fazer, de formas de inovação, quer estas se baseiem em problemas tecnológicos clássicos ou verifiquem novas tecnologias. Ou, simplesmente, na necessidade de olhar para as áreas como um todo, e ensaiar como ultrapassar as dicotomias disciplinares. Como encontrar novos modos de apropriação? Como consolidar o interesse por áreas tecnológicas situadas na periferia da formação em belas artes? Como afirmar, quer a especialização necessária quer a capacidade de cruzamento dando, espaço a novos âmbitos de aplicabilidade?

Pode parecer simples colocar este tipo de questões, mas num contexto formativo focado numa iniciação, especular nestes termos é um projeto difícil. Esse tempo de aprendizagem de que cada um necessita tem que suportar a interrogação mais profunda do entendimento do que cada media significa na descoberta da realidade. Desenvolver técnicas não basta, ainda que estas sejam colocadas a pretexto de arranque. Assim se determina, a estranheza da condição intermédia produz uma nova consciência; de que essa posição, pode ter vantagens, pois a partir da transgressão da fronteira ou da dificuldade em a determinar, descobre-se como revisitar áreas que pensávamos conhecer ou simplesmente queremos usar. Já a realidade da investigação não explora só factos ou estende as vantagens do saber-fazer acumuladas em anos, ainda que a estes seja dada inédita atenção. Num contexto criativo, somam-se testes implícitos a uma ideia de projeto, numa relação contínua com materiais, processos, métodos, enquanto meio para comunicar e reinventar a realidade que nos inspira e emociona, no seu assombro ou banalidade.

A palavra Specularis, no título, aponta para uma matéria natural, rara e preciosa – lapis specularis (1). No passado, a pedra de gesso ou “pedra espelho” era um material com interesse comercial, retirado de minas, e manipulado pelo simples corte em láminas diáfanas, transparentes e com brilhos dourados, para revelar o mundo e as suas aparências, luminosidade e sombra. Hoje, a atenção à matéria prima, ao substrato que serve de base a todas as especulações, natural ou artificial, vidro ou gesso fossilizado, metal ou papel, propõe-se à visualidade. Já a relação que se estabelece com as matérias é orgânica, corporal, fenomenal. Acolhe ou forma, a presença em acção, num corpo que desenha, pinta, esculpe, molda, decalca, imprime. Através de lâminas, matérias, placas, contemplamos, observamos, investigados, exploramos, reflectimos. Sobre uma base material, servimo-nos das tecnologias associadas à gravura ou ao vidro, para tocar nas imagens, movimentar e pressionar, arrastar e transferir. Entre ver e especular, em vários materiais, ou a rever a sua natureza de acordo com as mais básicas formas de inscrição e invenção, sucedem técnicas e a circulação entre as oficinas. São estas as experiências filtradas e decantadas a partir da capacidade instalada numa faculdade e entidades parceiras, levada aos limites, e num intervalo, se apresentam em exposição. Porque pretendemos redefinir a forma como pensamos as tecnologias enquanto instrumento de pensamento e de especulação sobre o mundo, o tempo, e o espaço de formação que habitamos.

Assim a exposição Specularis com o subtítulo look through, procura transmitir um novo olhar para a união da gravura e do vidro. Desta colaboração oficinal resultaram já dois projetos pluridisciplinares de iniciação à jovem investigação da Universidade do Porto, dedicados a pesquisa sobre suportes e substratos alternativos para a aplicação da imagem impressa. O primeiro projeto terminado em 2014 e dedicado precisamente à relação do vidro com a imagem impressa IJUP 2011, no262 “Vidro e Impressão: criação de matrizes e substratos de impressão alternativos”, e o último “vidro e impressão: monocozeduras sobre superfícies vítreas”. Os projetos tiveram o apoio institucional do i2ADS – Instituto de Investigação em Arte, Design e Sociedade da Faculdade de Belas Artes Universidade do Porto, e ainda uma bolsa de investigação resultante da colaboração com a VICARTE – Unidade de Investigação Vidro e Cerâmica para as artes sedeada no Campus da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa.

(1) Do latim, a tradução “pedra espelho”. Designa um tipo de gesso transparente usado pelo império Romano como alternativa mais económica ao vidro.