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Através de uma articulação artística e conceptual, em que o corpo da mulher, a flauta, o sopro, a noite e a gargalhada doída do pássaro Urutau se travessam num corpo comum, Marina Cyrino entrega-nos aos fantasmas que a luz nos roubou.
A narrativa ortodoxa do conhecimento Ocidental revela uma obsessão muito particular com a clareza. Clareza, não é apenas entendida como expressão do inteligível, mas também, como claridade da luz. A suposta naturalidade dessa associação entre saber e clareza, vela – ou seja, não ilumina – uma história de dominação, de obscurantismo, de oclusões, de supressões de outras formas e narrativas de ser, sentir e saber. Nesta genealogia, o dizer, o visível, o sólido e a afirmação masculina, surgem como elementos naturalmente tidos por lógicos e certos. O fato de que “às escuras, uma pessoa racional faz um exame de consciência muito mais perfeito do que às claras” (Amos Oz, “Uma pantera na cave” 1998; 58), deve-se apenas a uma parcimónia: reduzir a complexidade ajuda ao ato de síntese de consciência. Mas essa redução do complexo não é uma necessidade, mas uma escolha, já que o oposto do complexo não é a simplificação, mas o reducionismo. Essa é a transgressão perpetrada pela epistemologia da luz.
Convidamos a musicista e investigadora Marina Cyrino para dilatar estas preocupações neste ARD#6. Em “Ela é? um vibrar aeroelástico, o choro que chora a bruxa que chora cada bruxa que chora, ou uma estória de alguma maneira”, Marina Cyrino transporta-nos para a sua averiguação artística em torno da encoberta história da sujeição da sujeita, dentro do campo da música e do conhecimento. Através de uma articulação artística e conceptual, em que o corpo da mulher, a flauta, o sopro, a noite e a gargalhada doída do pássaro Urutau se travessam num corpo comum, Marina Cyrino entrega-nos aos fantasmas que a luz nos roubou.
Como citar:
Almeida, C. & Alves, A. (Eds.) (2019). Marina Cyrino. She is? an aeroelastic flutter, which weeps weeps the witch which weeps each witch, or that is a likely story | Ela é? um vibrar aeroelástico, o choro que chora a bruxa que chora cada bruxa que chora, ou uma estória de alguma maneira. Artistic research does, (6). https://doi.org/10.24840/978-989-54417-7-8
Artistic Research Does is a series of individual takes published on the topic of artistic research, yet anti-ologically designed. It consists of a number of short authored submissions, conceived under investigation and for the occasion, published in the individual booklets, once a month and bilingual-ly (PT/ENG). Since the editors are not native English speakers and thus are unable to provide professional translations, every and each of their efforts to adapt text will be signed at the end so that the interpretative contingency is kept in mind.