AR.CV

O algodão e a resistência a partir de Cabo Verde – cultivo do pensamento e práticas artísticas para uma história do presente

Projeto semente | i2ADS

Prática Artística, Política e Envolvimento Social
  • Referência
  • i2ADS-2021-AR.CV
  • Período
  • 01.01.2021 — 31.12.2025

Como podem o pensamento e práticas artísticas em torno do algodão, o seu poder histórico, e suas histórias de resistência, provocar diferentes processos de transformação social?

AR.CV procura reflectir criticamente sobre o cruzamento das forças da arte, ecologia e transformação social num contexto de crises ambiental, cognitiva, política, e cultural, tendo como foco o algodão a partir do projeto artístico “NI – Neve Insular” em São Vicente, Cabo Verde (CV), iniciado em 2018.

Observando a história da colonização portuguesa das ilhas de CV, com início no séc. XV, é conhecido que o algodão foi uma das bases do sistema escravocrata e cultural (Cabral, 2013, Torrão, 1991). Também é conhecida a panaria cabo-verdiana tanto pelo valor comercial para troca por pessoas escravizadas no período colonial (Carreira,1968, Shabaka, 2013), quanto pela permanência do seu encanto e representação identitária da nação independente (Figueira, 1998, Nolasco, 2018), apesar do desaparecimento do cultivo e dos saberes ancestrais ligados à panaria (Rainho, 2021a).

Deste modo, a NI tem proposto uma resistência à objetualização das memórias da plantação colonial de algodão; uma visibilidade sobre a destruição das espécies endémicas e dos saberes populares; e uma atenção à captura da panaria cabo-verdiana pela força do mercado de turismo (Nolasco, 2018). O projecto tem-se sido desenvolvido junto da comunidade, nos domínios agrícola, educativo e artístico, resgatando a cultura do algodão em CV, desde a semente, o seu cultivo e fiação, ao tear, numa atuação lenta com vários intervenientes humanos e não humanos (Rainho, 2021a).

É importante reforçar que o projeto de globalização económica é inseparável da plantação e da colónia (Mbembe, 2014). Neste contexto, a plantação baseada na escravatura, forjou um ciclo de exploração da terra, das pessoas e da cultura cujas marcas se mantêm até hoje de dimensão geopolítica global. É a partir da planta do algodão que AR.CV pretende realizar uma reflexão crítica sobre as suas representações discursivas, imagéticas e simbólicas. O estudo desta planta, dos ‘panos’ e seu poder histórico, permitirá considerar a resistência do pensamento e práticas artísticas a partir de CV, na era da lente crítica da plantationceno (Haraway, 2019, Myers 2020), e do modo como as artes podem contribuir para transformação social mobilizando a crítica sobre o poder histórico do algodão (Kesson-Arabindan, 2021, Kay, 2014).

Neste projeto é preciso aprofundamento em 4 principais diretrizes: i) O algodão em Cabo Verde como sinédoque da dimensão ecológica, política, cultural do colonialismo e capitalismo;  ii) A potencialidade transformadora do pensamento e prática artística na sua implicação social, articulando arte, educação, ecologia; iii) O arquivo como dispositivo oficial de discurso e poder colonizador, em tensão com o arquivo vital entre as memórias de resistência no presente; iv) A fabulação crítica (Hartman, 2008) enquanto ferramenta participada de criação e investigação para outras histórias do presente.

  • Investigador responsável
    Rita Rainho

  • Equipa
    Gabriela Alves, José Carlos de Paiva, Miguel Costa