O Porto está a passar por rápidas mudanças devido à ‘hipergentrificação’ após anos de subdesenvolvimento social sob medidas de austeridade impostas centralmente, que empobreceram os habitantes da cidade e os veem agora sendo expulsos das zonas centrais, enquanto esta se ressignifica como um destino turístico cultural. O custo do crescimento turístico é sem dúvida humano. Quanto mais a habitação é entendida como um investimento financeiro, mais provável é que aqueles que menos têm agora, menos ainda terão no futuro.
Outra questão em debate é a definição de cidade em si mesma, ou melhor, a distinção entre cidade e metrópole. Entendendo-se a cidade como tendo um carácter estático de espaço residencial com espessas camadas de história, herdeira da polisgrega, e a metrópole, a cidade genérica, sem confins e virtual.
É neste contexto extremamente complexo, que o grupo de estudo Cultura | Cidade: Um Direito! pretende operar, perguntando o que é hoje entendido como cidade e qual o papel da cultura na sua reformulação.
O Simpósio “Cultura | Cidade: Um Direito!” é o primeiro encontro de um ciclo de conversas em torno da democracia cultural e do direito à cidade. A realizar-se em 18 de outubro de 2019 na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, juntará duas associações da área do ativismo cultural e social, Papo Preta e PELE, numa conversa em torno da cidade/metrópole em mudança e suas problemáticas de inclusão/exclusão, de forma a analisar a participação ativista e artística na transformação do tecido urbano e social das nossas cidades/metrópoles. A conversa será moderada por Carla Cruz (i2ADS/FBAUP) e Tiago Assis (i2ADS/FBAUP).
Com esta série de conversas públicas, o grupo pretende entender a relação das práticas culturais e artísticas locais e a mudança do tecido urbano e social no Porto – as oportunidades e impossibilidades, simbioses e contaminações, instrumentalização e desvios.
Oradoras convidadas
Maria João Mota (PELE) Nascida no Porto em 1979, é pós-graduada em “Direitos Humanos e Democracia” e em “Teatro como Instrumento de Intervenção em Contextos Sócio-Educativos”. É co-fundadora da PELE_Espaço de Contacto Social e Cultural e do Núcleo de Teatro do Oprimido do Porto onde desempenha funções de Direção Artística e Coordenação de Projetos Nacionais e Internacionais desde 2007. Desenvolve um trabalho continuado de ação e reflexão no campo das Práticas Artísticas Comunitárias, nomeadamente em contextos e com grupos que revelem maior potencial de transformação.
PELE
A PELE é uma estrutura artística do Porto, criada em 2007, que desde a sua génese, aposta na afirmação da arte enquanto espaço privilegiado de diálogo e criação coletiva, procurando o equilíbrio entre ética e estética. Desenvolve uma pesquisa contínua incidindo na interação entre a criação artística e participação cívica e política. Organiza-se em 4 áreas de ação: Criação, Programação, Formação e o Núcleo de Teatro do Oprimido do Porto, e ao longo de mais de doze anos tem desenvolvido múltiplas criações, metodologias de trabalho e sistematizado processos de pensamento numa perspetiva de aprofundamento e consolidação do campo lato e fecundo das Práticas Artísticas Comunitárias. Desenvolve o seu trabalho numa lógica de interseção de disciplinas e setores como a cultura, a coesão social, política, a educação, a justiça, a saúde, o ambiente. A sua ação é norteada pelo princípio de construir processos e produtos artísticos que revelem qualidade estética, compromisso ético e eficácia no que diz respeito ao empoderamento individual e social.
Shenia Karlsson (Papo Preta)
A partir da sua vivência enquanto mulher e negra percebeu que ainda temos pouca representatividade em determinados lugares sociais, somos poucas ocupando determinados cargos e ainda somos associadas ao lado negativo das relações, como corpos desprovidos de afeto. Em seu exercício da Psicologia Social ao longo dos anos, constatou a carência de uma intervenção Psicoterapêutica que atendesse demandas específicas das mulheres negras de comunidades carentes do Rio de Janeiro, considerando que a maior parte do público é composto por mulheres negras. Desenvolveu um trabalho baseado em representatividade como psicóloga e negra, sentiu que contribuía de forma significativa utilizando uma escuta apurada sobre experiências que só atravessam a mulher negra, podendo assim desenvolver formas de enfrentamentos construídas especialmente a esse público em específico. Refletiu sobre a necessidade de se pensar uma Psicologia crítica e de uma prática que busca acima de tudo compreender os processos de construção de negros na sociedade e das perturbações oriundas de lógicas opressoras. Sendo assim desenvolveu uma metodologia de intervenção baseada em práticas psicológicas, ancestralidade, processos históricos da população da diáspora africana e cultura negra. A aderência por parte das pacientes ao trabalho obteve resultados surpreendentes provando que a identidade racial, a representatividade e principalmente estudos profundos sobre a temática do racismo são fundamentais na construção do bem estar e da saúde mental da mulher negra.
Papo Preta
Papo Preta é um projeto terapêutico voltado para a saúde e bem estar da mulher negra, com foco no cuidado da saúde mental. Nosso objetivo é propiciar a construção de espaços que promovam saúde emocional e bem estar psicológico. Um lugar de escuta, troca de experiências, construção de estratégias de enfrentamento e fortalecimento da autoestima, propiciando o empoderamento da mulher negra.
Inscrições A participação é gratuita, com inscrição obrigatória aqui