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Corpo, Espaço, Matéria

As primeiras duas estações do CEM acolheram artistas, investigadores e especialistas que debaterem metodologias e formas de pesquisa na interseção das artes plásticas e da sociedade.

  • Edição
  • Rute Rosas e Sofia Ponte
  • Ano
  • 2020
  • isbn | issn
  • 978-989-54703-6-5
Corpo, Espaço, Matéria

Organizámos o ciclo Corpo, Espaço, Matéria (CEM) — https://cem.fba.up.pt/ — no sentido de contribuir para a missão do Instituto de Investigação em Arte, Design e Sociedade (i2ADS) em fomentar uma comunidade de investigação, despertando os estudantes dos vários ciclos de estudo da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto (FBAUP) para as inúmeras possibilidades de investigação propiciadas por esta instituição. Este ciclo distingue-se dos demais por, na sua estrutura, criar cruzamentos e relações entre pares de I&Ds. O i2ADS organiza-se em “centros de pesquisa” que se distribuem pelas áreas das Artes Plásticas, Desenho, Design, Estudos Artísticos, Educação Artística, Música e Artes do Espetáculo. Os seus membros distribuem-se por projetos de investigação que tratam assuntos relacionados com estas áreas de pesquisa.

Cada Estação, das quatro que compõem um ciclo CEM, propõe um foco temático conduzido por um convidado e um extra-comentador convidado e acompanhadas por investigadores do i2ADS. O formato de cada sessão realiza-se de acordo com os convidados e a natureza das suas apresentações. Estas não só pressupõem uma conversa, mas um momento privilegiado de troca de ideias entre pares. O convidado é um artista ou especialista experiente que desenvolve uma conversa sobre o seu trabalho e formas de pesquisa. O extra-comentador convidado é um artista, especialista ou investigador experiente, exterior ao i2ADS, que desafia o convidado a focar-se numa etapa ou aspeto do seu trabalho e formas de pesquisa relacionadas. O comentador é um membro integrado do i2ADS, investigador experiente que sistematiza a conversa espoletada na sessão que integra. O Estudante PhD é um investigador inscrito num programa de doutoramento em Portugal.

As primeiras duas estações do CEM acolheram artistas, investigadores e especialistas que debaterem metodologias e formas de pesquisa na interseção das artes plásticas e da sociedade.

Os textos produzidos foram escritos por estudantes de doutoramento inscritos em universidades portuguesas, cuja pesquisa doutoral está próxima de um tema de uma das sessões CEM. Para este efeito, cada um foi convidado a realizar um artigo original que inclui material da sessão em que participou com o propósito de representar o que se passou na sessão através de algumas transcrições diretas. Estas transcrições captam fragmentos do diálogo dos convidados e de uma ou outra questão colocada por um elemento do público, com o objetivo de apresentar um olhar simultaneamente interno e externo à conversa. Integram esta publicação os textos do Maurício Alfaya, Bruno Ministro, Constança Babo, Paula Neves, Inês Veloso e Ana Temudo.

Coordenamos as primeiras seis conversas em torno de temas que se encontram para além das versões oficiais sobre o mundo, e que dão a conhecer diversos pontos de vista, como: a obsolescência de um determinado tempo histórico; o misterioso papel da cultura suburbana nas artes plásticas; as possibilidades criativas que a tecnocultura estabelece nas práticas artísticas recentes; o desenvolvimento de práticas artísticas como uma forma de resistência; a performatividade do banal e a experimentação como o lugar criativo per si. Nestes encontros geramos uma fertilização de ideias e cruzamento de metodologias de pesquisas (práticas e teóricas) interdisciplinares, próximas da história da arte e da arquitetura, das artes plásticas, da filosofia, da música experimental e da cultura DIY, com os mass-media. Este grupo de participantes exploraram alguns dos principais desafios que ajudam a compreender as mudanças ocorridas nas artes plásticas no século XXI e, sobretudo, permitiram o fortalecimento de um fórum público de debate de ideias como resposta direta aos desenvolvimentos e necessidades específicas da investigação em belas artes.

Realizámos um ensaio do ciclo CEM com a Estação #0, intitulado a Memória da Mão. Convidámos o escultor Efraín Almeida (BR) e o programador e produtor cultural, fundador dos Maus Hábitos e da Associação Saco Azul, Daniel Ramos Pires, para um diálogo sobre as suas experiências entre os meios culturais do Porto e Rio de Janeiro, desde 1990. Como se tratou de um ensaio, ambas assumimos o papel de comentadoras desta sessão. Para além de um laço de amizade, percebeu-se que existe uma enorme necessidade de desmistificar a cultura portuguesa no Brasil e vice-versa. Conversou-se ainda acerca do percurso e obra do artista, centrado na autobiografia e na apropriação do imaginário popular brasileiro e nos fenómenos da fé que deixam marcas no corpo humano. A preferência do artista por entalhes de artesãos populares e de ex‐votos são um traço comum na sua obra. De certa forma, podemos dizer que o trabalho de Efraín Almeida tanto evoca a harmonia do popular como do erudito, do intuitivo como do calculado e do simples como do sofisticado.

Em outubro de 2018, inauguramos o ciclo CEM com a Estação #1 Arte, Cultura, Tecnologia e Sociedade, que decorreu entre outubro de 2018 e janeiro de 2019 na Aula Magna da FBAUP. Esta estação pretendeu tornar mais consciente os cruzamentos históricos e menos comuns de processos de investigação originais. Pretendeu igualmente refletir sobre como a produção artística de um passado recente potência o pensamento, o comportamento e a forma atual de arte. As reflexões surgidas nesta matriz metodológica levam a uma variedade de temas do presente. Animados em problematizar o estado perpétuo de eventos “interessantes”, os convidados desta estação abordaram alguns paradoxos. As suas apresentações “Earthworks e Obras de Arte: criação e destruição da paisagem americana” por Eliana Sousa Santos, “O Lugar do Som nas Artes Plásticas” por Hugo Oliveira e “Get Hands Dirty: Artistas Plásticos Influenciadores Digitais” por Cristiana Felgueiras foram uma oportunidade para debater práticas artísticas que estimulam outro tipo de discursos sobre a atualidade e a arte contemporânea.

Vejamos como Maurício Alfaya explora no seu texto “Earthworks: Viagens, Paisagens e Confrontos”, o fenómeno disruptivo da intervenção de certos artistas, tais como Robert Smithson, Walter De Maria, Nancy Holt, Michael Heizer e James Turrell, sobre a paisagem deserta dos EUA. A sua abordagem explora a experiência da liminaridade enquanto conceito próximo a ritos de passagem. Uma experiência que uma longa viagem de carro pode vir a significar. Bruno Ministro, realiza o texto “A Plástica do Som na Arte dos Lugares: transcri(a)ção in-completa e (a)notada” onde representa um diálogo poético, pontuado pela inquietação, a partir de uma abordagem dinâmica ao processo de transcrição e dos temas abordados durante a da sessão “O Lugar do Som nas Artes Plásticas”. E Constança Babo no seu texto “Get Hands Dirty com Cristiana Felgueiras” introduz o leitor na complexidade dos vários níveis de experimentação que as possibilidades do multimédia e do online, presentemente permitem.

Em abril de 2019, demos seguimento à Estação #2 sob o tema O Método do Artista Enquanto Experiência Incorporada, onde refletimos sobre a ação performática e a representação dessa ação. As/Os oradoras/es não incentivaram a uma compreensão suave ou simples das estratégias plásticas, visuais e espaciais que desenvolvem, pelo contrário, as metodologias de trabalho que exploram colocam inúmeros desafios às formas presentes e passadas da atividade artística. As conversas desta estação, “Proposições de um Processo Artístico” por Claire de Santa Coloma, “Incorpus – Inimigo de todas as Construções” por Miguel Bonneville e “O que há numa linha?” por Helena Elias, trouxeram à superfície a natureza idiossincrática das práticas artísticas dos artistas e os desafios que a sua apresentação e exposição colocam à experiência do seu trabalho.

Paula Neves, no seu texto “(em) processo. transcrições” reflete como a prática artística problematiza os conceitos convencionais de arte, nomeadamente os relacionados com o fazer da escultura, e como o processo artístico pode acontecer como forma de resistir ao “fenómeno” da contemporaneidade. Inês Veloso também apresenta um texto reflexivo. O seu texto “Um Corpo e Seis Mãos” interroga a performance e os aspetos efémeros que encerra, numa perspetiva alheia à “espectacularidade” que um palco possibilita. Ana Temudo, no seu texto “O que há numa linha? – Nota de um encontro”, por sua vez, introduz o tema da criação e o da sua exposição, questionando o fluxo em que se inscrevem ambos os processos na experiência da arte atual.

As próximas estações, #3 e #4, centram-se nos temas Espaços de Ensaio nas Práticas Artísticas e Da Materialidade do Tempo com pressupostos que pretendem alargar a participação dos investigadores de acolhimento a membros do Instituto de Investigação em Design, Media e Cultura (ID+ – UP/UA/IPCA) e do Centro de Investigação Transdisciplinar «Cultura, Espaço e Memória» (CITCEM – UP). Assim esperamos dar um contributo no processo de solidificação da comunidade de investigação da FBAUP, incluindo outras áreas do conhecimento.

Aos diversos apoios recebidos através das direções do i2ADS e da FBAUP, da Licenciatura em Artes Plásticas e dos Mestrados em Artes Plásticas e em Design de Imagem, na pessoa do Professor Fernando Amaral da Cunha, Professor Francisco Laranjo e Professor José Carneiro, enquanto diretores destes programas de estudos; À Reitoria da Universidade do Porto/Banco Santander; À Patrícia Viana Almeida que garantiu o registo áudio de todas as sessões e ao incansável designer do CEM Pedro Brochado; Aos estudantes de mestrado da FBAUP, Inês Tartaruga Água, Sara Ramone, Gustavo Romeiro e Grécia Paola que tiveram a seu cargo a documentação visual do CEM; Ao apoio dedicado nas conversões para Inglês de Grécia Paola; À disponibilidade e incentivo que recebemos dos convidados: Eliana Sousa Santos, Hugo Oliveira, Cristiana Felgueiras, Claire de Santa Coloma, Miguel Bonneville, de Helena Elias e dos extra-comentadores: Inês Moreira, Rui Torres, Lídia Marôpo, Laura Castro, Pedro Arrifano, Ana Tomé; Aos investigadores do i2ADS, Daniela Coimbra, Claudia Amandi, Filipa Cruz e Vasco Cardoso,

Muito obrigada
As editoras, Rute Rosas & Sofia Ponte

Sobre

O CEM — Corpo, Espaço, Matéria é um ciclo de encontros organizados por investigadores do i2ADS/FBAUP/ESMAE que acolhe artistas, especialistas e outros profissionais da cultura para debater metodologias artísticas e formas de pesquisa na interseção da arte e da sociedade. Cada Estação propõe um foco temático sugerido por um convidado e um extra-comentador e acompanhadas por investigadores do i2ADS. A participação de convidados e extra-comentadores, especialistas exteriores ao centro de investigação da FBAUP, realça o carácter científico destes encontros. Estes não são apenas uma conversa mas são um momento privilegiado de troca de ideias entre pares. Por isso o formato de cada sessão muda de acordo com os convidados, os extra-comentadores e a natureza das suas apresentações. Organização de Rute Rosas e Sofia Ponte.

https://cem.fba.up.pt/