livro
É ao pé do baobá que nos fazemos sentir como quem está À sombra desta mangueira para podermos nos reunir, dialogar, discutir, resistir e persistir, buscando colocar em circulação questões urgentes que reverberem em outros modos de estar no e estar com o mundo.
Este livro é fruto dos relacionamentos que, ao longo do tempo, se estabeleceram entre professoras(es) e pesquisadoras(es) de artes, do Brasil e de Portugal, que em suas geografias específicas de saberes, afetos e atuações têm perseguido diferentes possibilidades de compreender, interferir e configurar um campo do ensino artístico atravessado por posicionamentos cotidianos críticos, poéticos e eminentemente políticos.
É ao pé do baobá – imagem de capa desta publicação – que nos fazemos sentir como quem está À sombra desta mangueira – título de obra do educador Paulo Freire – para podermos nos reunir, dialogar, discutir, resistir e persistir, buscando colocar em circulação questões urgentes que reverberem em outros modos de estar no e estar com o mundo, afinal, parafraseando Paulo Freire, precisamos do mundo, como o mundo precisa de nós. Uma sombra boa para procurarmos por outros discursos sobre as artes e o seu ensino, que não esgotem o assunto e nem tomem as artes como salvadoras, mas que nos permitam adensar, aprofundar, diferenciar e reordenar pensamentos e ações.
Aquilo que é discutido nesta publicação guarda estreitas relações com o I Congresso Internacional “Diálogos entre Brasil e Portugal: o ensino artístico que temos e o que queremos”, realizado entre os dias 7 e 11 de setembro de 2020 na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, tratando-se de um desdobramento e uma continuidade das reflexões e ponderações iniciadas neste congresso, não devendo, por isso, ser entendido como seus anais ou atas. Os textos aqui apresentados são de autoras e autores que, tendo participado no congresso como conferencistas convidadas/os, comunicadoras/es ou moderadoras/es, retrabalharam os seus contributos ampliando-os, revendo-os e modificando-os após deixarem-se permear por aquilo que o encontro proporcionou.
O livro está estruturado em quatro partes, propostas não enquanto linhas temáticas, mas como eixos problematizadores que conferem aos textos uma primeira perspectiva de leitura – dentre muitas outras possíveis –, mobilizando-os em zonas de discussão que pretendemos que sejam provisórias, mutáveis e transitáveis, por considerarmos que cada artigo poderá percorrer diferentes eixos, dialogar com outros textos, práticas e reflexões, diluindo as fronteiras entre as próprias partes da publicação. Por isso, fica aqui o nosso desejo de que quem nos lê pratique uma desobediência que permita ir além da ordenação proposta, desorganizando, em pensamento, os textos apresentados. Tendo feito esta ressalva, podemos então dizer do nosso trabalho na concepção de cada eixo.
A iniciar a publicação, os textos constantes em “Posturas, práticas e lutas de(s)coloniais” nos incitam a, rigorosamente, observar o rastro colonizador que sobrevive em nossas práticas artísticas e educativas, impondo sobre sujeitas e sujeitos da história formas culturais hegemônicas. Fica aqui o ensejo de que, despindo-nos das posturas coloniais que nos foram incrustadas e localizando os entusiasmos latentes em nossas comunidades possamos, através da luta e da resistência, reorganizar a arquitetura social na qual vivemos.
Em “Histórias, memórias e (des)aprendizagens: ponderações desde o presente”, encontramos pesquisas que, debruçadas sobre o trabalho junto de histórias – pessoais e coletivas –, colaboraram na reconfiguração do presente vivido, na formação docente e na historiografia do campo do ensino artístico.
O eixo “Processos e experiências de criação no fazer e ensinar artísticos” traz-nos reflexões baseadas em práticas de ateliê e em espaços educativos formais e não-formais que buscam por condições epistemológicas e metodológicas diversificadas para pensar, fazer e promover a prática artística.
Por fim, na parte “Do dever-ser ao devir artístico e educativo” localizam-se textos que repensam criticamente o próprio pensamento crítico, compreendem a prática docente como ato político/poético e problematizam diretrizes e documentos oficiais que instituem modos de controle e governo que instrumentalizam as artes e a educação.
Com esta publicação, assim como no congresso que a precedeu, transportamos a vontade de fomentar um movimento entre a análise do ensino artístico que temos e a ousadia de avançar para o ensino artístico que queremos. É neste sentido que convidamo-vos a estarem conosco a partilhar a sombra deste baobá.
Sidiney Peterson e Amanda Midori