livro
A minha abordagem enquanto artista plástica, neste projeto, reflete sobre questões ecológicas e politico-sociais.
Em 2013 desenvolvi um trabalho a partir da visita guiada por um antigo mineiro, o Agostinho, às Minas de carvão do Pejão. Este, resultou numa conversa manuscrita junto com algumas imagens do lugar e num objeto livro com fotografias noturnas a preto e branco. A vontade de fazer fotografias à noite provavelmente reflete a minha ideia de que os fantasmas são visíveis à noite. Reconheço que foi uma experiência mista, entre a satisfação que a experimentação me dá e o medo de que na escuridão daqueles túneis algo inesperado surgisse. Não havia luz em toda a extensão do lugar, e os enquadramentos fotográficos analógicos foram feitos à maneira das toupeiras. Em 2017 houve um grande incêndio e voltei para sentir a transformação de um lugar que conheci como preto pela escuridão da noite e que se tornou preto pela cor e pelo cheiro das queimaduras. Captei imagens em movimento enquanto pude, pois a agonia de presenciar um lugar em tal estado, cria mal estar.
No caminho de regresso encontrei uma fábrica de carvão na berma da estrada. Nunca tinha visto como se fazia o carvão vegetal. Mais uma vez, a cor preta, o cheiro a queimado e o fumo. Muito fumo. Novamente, lugar ideal para os fantasmas. Voltei em 2021 inserida num projeto com investigadores de diferentes áreas do saber com o objetivo de aprofundar o conhecimento sobre contaminação em antigas zonas mineiras. Contaminação do solo, da água, do ar, do bosque… elementos essências da qual nós, humanos e não humanos, dependemos.
Voltei ao lugar, não através do preto, da escuridão e da fantasmagoria, mas antes numa tentativa de ligar o solo, sofredor de décadas de extração, à comunidade local. Uma espécie de voltar às origens, um olhar de quem respeita os direitos da natureza em vez de um olhar de quem explora o solo assumindo-o como um recurso. Esta publicação conta-nos experiências, encontros, conversas que se desenvolveram à volta do charco, não apenas com a comunidade local mas com diferentes entidades que me acompanharam no processo.
(Trecho retirado do Prólogo de À Volta do Charco)
Susana Soares Pinto